Vivemos em rede. Somos, querendo ou não, entes conectantes vivendo interconectados. A tecnologia invadiu o nosso cotidiano de forma avassaladora. Muitas das nossas ações cotidianas são mediadas pelas TICs – Tecnologias de Informação e Comunicação, fato que pode trazer inúmeros benefícios, quando bem administrado.
A simples ideia de ficar desconectado pode desencadear uma verdadeira comoção de proporções muitas vezes comprometedoras.
Cada época desenvolve características próprias, sendo marcada por suas glórias e mazelas. Temos acesso a uma enorme quantidade de produtos e serviços digitais – inclusive muitas relações interpessoais, de forma que é esperado um aumento significativo do lugar de importância que a internet passou a ocupar na vida contemporânea. O lado perverso de toda essa facilidade é a enorme capacidade de causar sérios prejuízos à saúde física e psíquica que o uso indiscriminado da internet pode desencadear, sem falar nos prejuízos de ordem social e coletiva.
Dentre esses possíveis comprometimentos encontra-se a nomofobia, que é a fobia desencadeada pelo desconforto ou angústia resultante da incapacidade de acesso à comunicação através de aparelhos celulares, tablets ou computadores de modo geral. A simples ideia de ficar desconectado pode desencadear uma verdadeira comoção de proporções muitas vezes comprometedoras.
O termo é originário da Inglaterra, e deriva da expressão no-mobile, que significa sem celular, acrescido do sufixo fobos, palavra grega que simboliza medo ou fobia. Essa junção cunhou a palavra nomofobia, também conhecida como dependência digital, condição que gera impactos negativos à saúde do indivíduo, com implicações físicas, psicológicas e sociais.
De acordo com estudiosos do tema, os portadores da nomofobia tendem a apresentar paralelamente alguma outra condição de saúde associada, como transtornos de ansiedade, pânico, transtorno obsessivo-compulsivo ou agorafobia, dentre outros, que atuam como base ou facilitadores para o surgimento da dependência digital. Se identificado algum outro transtorno, pode ser necessária a implementação de terapia medicamentosa, sempre prescrita por um profissional habilitado, no caso o médico especialista – psiquiatra.
Quando as interações com o mundo virtual ameaçam a habilidade ou o interesse da permanência no mundo real, deve ser avaliada a possibilidade da existência de dependência, que se não identificada e tratada adequadamente, tende a ocasionar inúmeras perdas, inclusive a ausência de controle da própria vida.
Os prejuízos que a nomofobia pode acarretar são inúmeros. Ansiedade, angústia, taquicardia, sudorese intensa, depressão, isolamento social, inabilidade nas relações interpessoais, problemas de postura, insônia, agitação psicomotora e transtornos da visão, dentre muitos outros, são os mais facilmente identificados. Contudo, o uso contínuo das tecnologias da informação por si só não caracteriza dependência. O contexto deve ser avaliado. Na atualidade, em decorrência das inúmeras restrições impostas à população mundial em razão da pandemia de COVID-19, a tecnologia assumiu um protagonismo inevitável, mas certamente perigoso.
A dependência digital se caracteriza pelo uso excessivo e lesivo da tecnologia, acarretando perdas diversas para a pessoa acometida. Quando as interações com o mundo virtual ameaçam a habilidade ou o interesse da permanência no mundo real, deve ser avaliada a possibilidade da existência de dependência, que se não identificada e tratada adequadamente, tende a ocasionar inúmeras perdas, inclusive a ausência de controle da própria vida.
Outro fator preocupante é o crescimento da dependência digital entre crianças e adolescentes. A nomofobia tem assolado pessoas de todas as idades, de diferentes contextos socioeconômicos e culturais. Identificar tal condição nem sempre é simples, uma vez que a vida moderna é mediada pela presença digital e essa não é uma escolha. Não há formas viáveis de subsistência completamente à margem do uso de tecnologias, ainda que indiretamente. O simples ato de sacar dinheiro da conta bancária passa pela interação com o mundo digital. Adicionalmente, é quase sempre desconfortável se perceber dependente de qualquer situação, e a tendência maior é a negação, com justificativas racionais de que a situação está sob controle, e que é possível regular o ritmo da interação digital a qualquer instante. É comum que a constatação da condição se dê através da observação de terceiros, sejam esses parentes ou pessoas próximas.
Quando as interações com o mundo virtual ameaçam a habilidade ou o interesse da permanência no mundo real, deve ser avaliada a possibilidade da existência de dependência, que se não identificada e tratada adequadamente, tende a ocasionar inúmeras perdas, inclusive a ausência de controle da própria vida.
Dentre os fatores de risco para o surgimento da nomofobia estão a baixa autoestima, dificuldades nos relacionamentos interpessoais, uso excessivo das redes sociais e internet, interação social precária, timidez excessiva, vícios nos sistemas de recompensa das redes sociais como número de views, likes, retuites, curtidas, necessidade constante de compartilhamento de atos rotineiros da vida como uma simples refeição e comportamentos afins. Isso não significa, de modo algum, que pessoas que não apresentem os fatores de risco não possam desenvolvê-la, tampouco que os que têm predisposição irão apresentar essa condição. Os casos devem ser analisados dentro de um contexto mais amplo e de forma individualizada.
Uma forma prática de identificar possíveis sintomas de dependência digital consiste em abster-se, periodicamente, de celulares e computadores por períodos pré-determinados de tempo, como um período do dia ou até mesmo um final de semana completo e observar, de forma sincera, como foi a experiência, se possível registrando num papel as principais emoções detectadas. Os sintomas da dependência digital se manifestam de diferentes formas. Os principais sinais são ansiedade, irritação, sensação de perda de tempo, sentimentos de inutilidade, raiva, frustração, incompletude, apatia, tristeza e dificuldade de se desligar ou se concentrar em outras atividades fora da rede estão entre os mais relatados.
O Brasil é um dos países mais fortemente ligados à internet, de acordo com o Comitê Gestor de Internet no Brasil, sendo as principais atividades dos usuários brasileiros o uso de aplicativos de trocas de mensagens como WhatsApp, Skype ou Snapchat e redes sociais como Instagram e Facebook. De acordo com a pesquisa TIC Domicílios realizada em 2019 pelo Centro Regional para o Desenvolvimento de Estudos sobre a Sociedade da Informação – Cetic.br, vinculado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil, três em cada quatro brasileiros acessam a internet regularmente, o que equivale a 134 milhões de pessoas.
Apesar disso, a nomofobia ainda é timidamente divulgada no Brasil, o que dificulta um pouco a identificação do problema e a procura por tratamento. Países como o Japão, a China e a Coreia do Sul tratam a dependência digital como questão de saúde pública, onde foram criados vários centros de tratamento especializado. A Universidade Federal do Rio de Janeiro mantém um centro especializado para a detecção e tratamento da dependência digital, o Delete, que oferece tratamento multidisciplinar para o enfrentamento da patologia. Caso perceba, em você ou em alguém próximo, indicativos dessa condição, não hesite em buscar orientação profissional na sua cidade. Quanto mais cedo a detecção e a intervenção, maior o êxito do tratamento. A prática de exercícios físicos, a diminuição gradual do uso da internet e a implementação de outras formas de lazer podem ser muito úteis. Também a psicoterapia tem se mostrado extremamente eficaz para auxiliar nesse processo, podendo proporcionar mudanças qualitativas com resultados gratificantes. Nenhum algoritmo é capaz de substituir satisfatoriamente a interação humana de qualidade.
Bibliografia
Agencia Brasil. Brasil tem 134 milhões de usuários de internet. Publicado em 26/05/2020 – 16:59 Por Jonas Valente – Repórter Agência Brasil – Brasília
Atualizado em 26/05/2020 – 20:47. Disponível em http//www.agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2020-5/brasil-tem-mais-de-123-milhoes-de-usuarios-de-internet-aponta-pesquisa Acesso em 10 de novembro de 2020.
Meio Bit – Ciência – Delete — Instituto brasileiro combate abuso e dependência de tecnologias digitais. Ronaldo Gogoni. Disponível em https://www1.tecnoblog.net/meiobit/2017/brasil-instituto-delete-fundacao-trata-dependencia-digital-smartphones-games-internet-redes-sociais/. Acesso em 30 de dezembro de 2020.
Adolescentes e dependência digital – EPC – Escola Presbiteriana de Cuiabá (epcba.com.br). Disponível em https://epcba.com.br/adolescentes-e-dependencia-digital/. Acesso em 30 de dezembro de 2020.
O que é nomofobia? Entenda sobre a síndrome da dependência digital. Disponível em https://blog.psicologiaviva.com.br/. Acesso em 30 de dezembro de 2020.